04/07/2023

Curta metragem 01:

 

Era a sua formatura do ABC,

O dia da grande apresentação, a festa mais esperada com a presença de todos os familiares e professores

Um passo à frente, com sapatilha de lacinho rosa e bem decorado, simetricamente acompanhado com elevação do queixo e braço arqueado. Mas suave, no tempo certo, igual ao da colega ao lado, sem errar o tempo da música

Não era bonito para ela

Havia suor, pânico, medo do passo inadequado, da ordem e do grito

Tudo se abafava e isolava nela; era o que tinha para ser seguido

E tinha que seguir

As luzes se acendiam, todos no salão prontos para assistir à apresentação

A sua luz não estava ali

Eram passos simétricos, ensaiados com coerção, esteticamente adequados e pontuados

Aplausos

Para que? Para quem?

Linda apresentação

Péssimas memórias

A estrada em que não há chegada

 

Alta demanda de quem nunca se preenche

Mas por que busca inundar-se do outro quando em si já há tanto?

Na falta de clareza de quem se é

Predomina sempre o que há de fora

Ofusca a força e a beleza que há por dentro

Mas és o que também move

O que é chama e também queima

O que movimenta

A difícil quietude

A estrada em que não há chegada

28/03/2023

28.3

 Dentre o frio que expande o sentir, também ofusca a verdade do ser 

Empurra feito avalanche, 

Que desce feroz, feito o bicho faminto


Mas ao fim, se desmancha 


Apenas líquido 


Apenas sentir

18/05/2017

emoções e limites

O limite vai além do que enxergo e sinto
Sou sujeito que não aceita todas as regras
Egoísta por querer viver um mundo meu
Aprendendo a viver o de todos que é na verdade o de alguns
Se ajustando pra não sumir

O prazer é remodelado e menos intuitivo
Mas as lembranças ainda tem cheiros, tem cores..
Há sempre um pouco de nós a cada troca.. um velho que vai.. um novo que fica
Perceber o mundo com sensações que nem sempre cabem na enciclopédia

É o caminho diário pelas fúrias que inquietam a alma
Que acorda o peito

Que me faz limitada

30/12/2016

céu e inferno, sim sinhô

o céu e o inferno, rapaz
tá na cabeça da gente
pode ser no gozo da alegria
ou na dor da morte de cada dia
não é lá distante não
é aqui pertinho
cá dentro
do passado amargurado
ao colo abençoado
tudo é marca que se guarda
o peito, às vezes, cala
mas sente

a mente se mistura com tanta informação
tem dias que só vem coisa boa
tem dias que é só escuridão

às vezes fico tonto, zonzo, querendo aquietar tudo
mas tem que ser de mansinho
com calma
como um anjinho
que compreende essa confusão
que respira fundo na imensidão
e vai ouvindo devagarinho

o barulho tem horas que bate no peito
congela tudo
dá um desespero porque não tem pra onde fugir
mas lá debaixo
bem pertinho
tem o colo, o aconchego
as lembranças dos dias bons
é esse que se deve pensar
relembrar

é a calma e o silêncio consciente que vence o barulho
é se conhecer
e entender o nosso céu e inferno de cada dia, sim sinhô

17/10/2016

conhece-te

no beijo profundo
sinto o hálito que vem de tuas emoções digeridas
de tuas percepções sentidas
daquilo que tu não vistes 
da escolha que tu não fizestes

esse sabor muda junto com a tua fala
e tu te torna o instante
o sopro que tocou
a lágrima que enxugou
o grito que calou

e o sussurro mudo se torna amigo
ou é cruel com tua carne
mas teu delírio já não te enlouquece
porque já te é conhecido
o fogo que te atormenta
e o afago que te acalenta


21/03/2016

fiel companheiro

vens mais uma vez sugar da minha boca o ar que me aquece                                    
tua língua é navalha que corta e sangra mas também adormece             (tú)
me fundo em teu corpo e me espalho por tuas faces traiçoeiras
meu fiel companheiro que desenha quem eu sou
que nem sei quando não é dor
que nem sei por quê
que nem sou são
quando depressa
sou só